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Faze o que tu queres será o todo da Lei.

Tenho que iniciar este texto advertindo que ele é o que está descrito no título: devaneios. Mas de todo, estes não são ruins e podem ser um divertido exercício mental.

As origens sobre a sexta-feira 13 são variadas e em sua maioria lendas muito interessantes e outras até irônicas. Por exemplo, nesta data o monarca Felipe IV ordenou a perseguição aos Templários em todo o território francês, no mês de outubro de 1307 (com certeza me dei ao trabalho de conferir o calendário deste ano, e sim, o dia 13 de outubro de 1307 ocorreu em uma sexta). Outra ideia está no cristianismo: 12 apóstolos e o Cristo formando um grupo de treze pessoas durante a Santa Ceia e, visto que o mito da crucificação ocorre em uma sexta, fica estabelecida a relação agourenta.

As ideias sobre o número treze são abundantes, chegando ao ponto de algumas pessoas sofrerem de Triscaidecafobia. E não é para menos, dependendo do conjunto de crenças que uma pessoa possa ter: a Besta do Apocalipse é descrita no capítulo 13; e não podemos esquecer que um Coven é formado por no máximo 13 Bruxas; 13 também são os ciclos da lua em um ano; e até dizem alguns numerólogos “nova era” que a soma simples do número 13 (1+3) resultando em 4, demonstra que na verdade os aspectos do número são positivos, pois o 4 é um número de estabilidade e concretização. Não sou numeróloga e minha capacidade em Gematria é muito incipiente para fazer uma análise, mas tenho para mim que todos os números são benéficos: definitivamente não é parte do trabalho mágicko-espiritual se perder em crendices populares, ainda que elas sejam engraçadas.

Já a organização dos dias da semana tem origens babilônicas e esta convenção se estabelece no império Romano, tendo como base a astrologia de maneira a organizar em “sete manhãs”, do latim septimana. Os dias, dedicados cada um a uma divindade médio-oriental, posteriormente foram substituídos por equivalentes latinos que também possuíam representações planetárias: segunda: Lua; terça: Marte, quarta: Mercúrio; quinta: Júpiter; sexta: Vênus; sábado: Saturno; Domingo: Sol.

Na língua inglesa Tuesday, Wednesday, Thursday e Friday altera essa lógica tendo como referências a mitologia nórdica: Tuesday (terça) relaciona-se à Tyu – deus da Guerra. Este, por sua vez, origina também Thursday (quinta). Odin dá origem à Wednesday (quarta) e a sexta relaciona-se à deusa Fraye (Friday). Interessante observar que o Sábado deriva do hebraico Shabbath, o dia de descanso no velho testamento. E ainda tem lá suas relações com os cultos pagãos (Saturnália) que posteriormente passou a ser denominação para a festividades sazonais das Bruxas, os Sabás. O cristianismo buscou extirpar todas as relações pagãs dos dias da semana e, por exemplo, substituiu o “dies solis” por “dominica”, dia do senhor (Sunday, Domingo), colocando-o como o primeiro dia e, portanto, o Monday passou a ser o segundo dia (Segunda) e assim consecutivamente, mantendo o Sábado (Saturno, Shabbath, Sabá). A língua espanhola preservou o sentido pagão, Segunda Lunes, etc. assim como a língua italiana, Lunedì, Lua, Segunda.

O termo feira para denominação dos dias da semana é também de origem cristã e se estabeleceu devido as festividades da páscoa, onde eram organizadas feiras ao ar livre. O banimento das referências pagãs acompanhou a inclusão do termo feira para fortalecer a afinidade com as festas cristãs, que bem sabemos são reproduções das festividades pagãs que foram absorvidas para que processo de conversão fosse possível. A páscoa não passa de uma cópia das festas de primavera, com adições da mitologia cristã. O Ovo tem suas relações com Eostre e não consigo, no momento, associá-lo ao Nazareno.

Bom o que importa aqui é que Freia, Vênus e Ishtar são deusas com atributos correlatos e a relação primeira que nos vem à cabeça, sem sombras de dúvidas, é que estas deusas estão conexas ao amor. Vênus também é a representação planetária da sétima Sephirot Netzach que significa Vitória. Esta esfera em particular tem relações com a Virtude do Desprendimento e a experiência espiritual da Visão da Beleza Triunfante e sua imagem é a de uma Mulher Nua, o que nos remete as deusas já citadas. Mas Beleza é o nome da esfera de Tipharet, cuja Virtude é a Devoção à Grande Obra e a experiência espiritual sendo a Visão da Harmonia. É em Tiphareth que está parte significativa do equilíbrio do desenho geométrico da Árvore da Vida e tem associações com o Sagrado Anjo Guardião, além de ser relacionada ao Sol, à Baphoment, etc. A visão desta esfera é a de um Rei Majestoso, uma Criança, ou um Deus Sacrificado.

Então o devaneio até que fica interessante a partir daqui: o caminho 24 que liga Tiphareth à Netzach é representado pelo Atu XIII do Tarot, A Morte. Ora! Não podemos nos esquecer que o amor em Thelema, além de ser Ágape, está sob vontade, ele é condicionado pela Vontade. E a Vontade é algo que conquistamos ou descobrimos ao sacrificarmos (sacrífico – sacro ofício) muito de nossas errôneas impressões sobre nós mesmos e o mundo em um processo de autoconhecimento profundo. E visto que Netzach-Vênus se associa à Virtude do Desprendimento, este pode ser experimentado pelo ensinamento dado nesta carta do Tarot, a temida Morte! Podemos entender que a Vontade está em Tiphareth assim como a Devoção à Grande Obra. Portanto, é pelo caminho da Morte que seguimos este objetivo. Amor sob vontade: Tiphareth acima de Netzach.

Hesíodo menciona que a deusa Afrodite teria surgido após Cronos cortar os órgãos sexuais de Urano e jogá-los ao mar, sendo o esperma – espuma – e o mar o meio de “fabricação” da Deusa. Isso me leva a outro devaneio: o esgotamento (morte) seguido do orgasmo. Nesse sentido sexo e morte estão de mãos dadas. De fato, essa versão do nascimento de Afrodite tem lá suas relações com a ideia da Morte, da foice que ceifa algo; o corte, a perda, o desprendimento. E a Foice é um símbolo bem presente no Atu XIII e aconselho uma consulta sobre esta carta no Livro de Thoth, pois lá percebemos um sentido mais profundo desse Atu associado a Escorpião e à letra hebraica Nun. E foice me lembra os ciclos agrícolas: plantamos com amor, cuidamos das plantas com carinho e muito trabalho e as ceifamos para o sustento, assim como fazemos com os animais (esqueçam por um momento a cruel indústria agropecuária). Então o ato do amor está, em certa medida, relacionado com algum nível de Desprendimento, como é a Virtude de Netzach, com a Morte de algo. Afinal para nascer é preciso morrer e para morrer é preciso nascer e o amor une todas estas coisas.

Então o Devaneio da Sexta-feira 13, ou melhor, o Devaneio do Dies Veneris 13 (o calendário thelemico resgata as nomenclaturas pagãs-planetárias) é este: um dia que nada mais é como todos os outros, mas que, visto a profusão de significados que podemos extrair do dia da semana e do número, é possível que possamos exercitar de forma mais corajosa nossas Vontades, sem temor sobre qual Morte nos espera para conseguir tal consecução. E apenas para ilustrar que a Morte nada mais é do que um estágio da continuidade da vida, lembremos que “…no Aeon de Hórus, todo evento é uma morte; sujeito e objeto se matam um ao outro em ‘amor sob vontade’; cada uma de tais mortes é em si vida, o meio pelo qual realizamos a nós mesmo através de uma série de episódios”. (Book 4, A Fórmula do I.A.O.).

Feliz Veneris 13!

Amor é a lei, amor sob vontade.

Autora: Soror Lótus